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sexta-feira, 17 de abril de 2009

ESPUMAS, AERAÇÃO...BUBBLES

Tendências da "cozinha desconstrutivista" ou "gastronomia molecular" aos poucos vêm sendo incorporadas em cardápios do mundo inteiro; em Casamentos inclusive! Questão que deve ser analizada com carinho!
Seguem alguns trechos longos porém divertidos da crítica de Rogério Fasano, ao consagrado restaurante inglês Fat Duck (concorrente do El Buli de Ferran Adrià).

“Desde criança, sou daqueles conhecidos como ‘do contra’. Basta inventarem uma nova tendência ou modismo que procuro uma ponte para passar por cima. Esse jeito de ser me faz invariavelmente adepto do ditado ‘não fui, não vi e não gostei’. Por isso, demorei tanto tempo para tomar conhecimento da chamada ‘atual modernidade gastronômica’. Resolvi começar pelo que os aficionados desse tipo de cozinha consideram o mais ousado do mundo, o Fat Duck, a uma hora de Londres... eu, minha mulher Ana, Drauzio Varella, sua mulher Regina e um amigo em comum, Isay Weinfeld (com quem já dividi inúmeros giros gastronômicos pela Itália)... iríamos... entrar na experiência inglesa gastromolecular de Mr.Blumenthal... Tinha medo do que estava por vir... Venho de uma família que tem como filosofia que uma refeição perdida nunca é recuperada...
Antipasto 1: nitro chá verde e mousse de limão.Uma espuma de limão extraída de um sifão é jogada dentro de um pote com nitrogênio a 150 graus negativos, tornando-se imediatamente sólida, a comida vapt-vupt. O efeito? Quase nulo. Apenas amortece um pouco a língua...
Antipasto 2: Ostra com molho de maracujá em mousse de gelatina. Gostaria de deixar aqui uma pergunta: existirá no universo algum tipo de molho que melhore uma ostra? Duvido... Fico imaginando quem foi o sujeito que inventou que a comida gourmand tem que ser agridoce. Guilhotina nele.
Antipasto 3: Sorvete de mostarda com gaspacho de beterraba. Desfrutamos o gaspacho de beterraba, com um insípido pãozinho servido frio. Quanto ao sorvete de mostarda, é exatamente o que se pode imaginar de um sorvete de mostarda. Estranhíssimo.
Antipasto 4:Pequenas geléias de sabores variados, que não consigo descrever, e cuja matéria-prima ninguém conseguiu identificar.
Antipasto 5: Pequenas torradas com trufas pretas. Excepcionalmente são sólidas e normais na aparência. ... Mesmo sabendo, nós e o Sr. Blumenthal, que as trufas encontradas nesta época do ano são as piores que existem. Gostaria de fazer aqui um a parte: trufa é algo sublime que costuma mudar para melhor quase tudo aquilo que toca. Não confundir com óleo de trufa, que costuma ter o efeito contrário: destrói tudo e parece feito pela Esso, pois tem gosto de gasolina.
1º prato: Escargots com presunto espanhol e erva doce ‘barbeadas’. Muito saboroso.
2 º prato: A quantidade de açúcar que acompanha o foie gras com cereja e camomila nos trouxe de volta à realidade.
3 º prato: Chamado sound of the sea; um espuma branca de textura estranhíssima, com uma espécie de areia-farofa servida ao lado. E acompanhada de quê? De um iPod. Sério! Todos nós recebemos o aparelho, que fomos obrigados a usar, e que reproduzia barulhos do mar... faria o mesmo efeito, uma concha marinha...
4 º prato: Já estava perdendo a paciência com nosso amigo Pato Gordo quando chegou um salmão pochê com aspargos, alcaçuz e grapefruit. Sem exageros, considero o pior salmão que comi na vida.
Último prato: Excepcional costeleta de carneiro, porque estávamos na terra do melhor carneiro do mundo, mas era servida com um molho doce, muito doce. O Fat Duck é quase uma confeitaria, que serve alguns salgados...
Meu jantar aqui chegou ao fim. Pulei os doces, pois já tinha comido açúcar demais...A sobremesa mais famosa do lugar é um sorvete assim descrito: ‘nitro-ovos mexidos e sorvete de bacon’. Se o sorvete de mostarda já tinha sido duro, o que fazer então com a versão em bacon?
Olhei para Isay - arquiteto moderno, antenado, culto, contemporâneo, enfim, entre os grandes... The end: a conta, 1.300 libras ou R$ 5.600... Voltamos ao nosso motorista, mais inglês impossível, e acostumado a levar pessoas ao Fat Duck, que com muito sarcasmo pergunta: ‘Any good?’. Isay de bate pronto: ‘No’. Motorista: ‘Lots of people say that’. Penso: nem tudo está perdido.”
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Publicada há tempos na Revista Gula... gerou polêmica!
Indiscutível: Existe algo mais pretencioso que azeite de trufas?... Não chega nem próximo a iguaria original e... só o cheiro me dá nausesas...